UMA ANÁLISE "DESARMADA" SOBRE O ARTIGO DE BRUNO ZENI: O NEGRO DRAMA DO RAP: ENTRE A LEI DO CÃO E A LEI DA SELVA"
Para uma melhor compreensão, iniciaremos com alguns esclarecimentos dados pelo autor sobre a história do rap.
1. 1. O rap é uma abreviação da expressão inglesa rythym and poetry, que significa ritmo e poesia.
2. Em tradução literal, a expressão da língua inglesa “hip hop”, significa: pular e mexer os quadris. Historicamente, foi cunhada pelo DJ Africa Bambaataa no final da década de 1960 para designar as festas de rua no bairro do Bronx, em Nova York, maciçamente freqüentadas por jovens negros.
2. Em tradução literal, a expressão da língua inglesa “hip hop”, significa: pular e mexer os quadris. Historicamente, foi cunhada pelo DJ Africa Bambaataa no final da década de 1960 para designar as festas de rua no bairro do Bronx, em Nova York, maciçamente freqüentadas por jovens negros.
DJ Africa Bambaataa |
3. 3. O hip hop é constituído por quatro elementos: o break (a dança de passos robóticos, quando realizada em equipe, sincronizados), o grafite (a pintura, normalmente feita com spray, aplicada nos muros da cidade), o DJ (o Disc-Jóquei) e o rapper (ou MC, mestre de cerimônias, aquele que canta ou declama as letras sobre as bases eletrônicas criadas e executadas ao vivo pelo DJ). Alguns integrantes do movimento consideram também um quinto elemento: a conscientização, o conhecimento histórico da luta dos negros, o combate ao preconceito racial, a recusa em aparecer na grande mídia e o menosprezo por valores como a ganância, a fama e o sucesso fácil.
Breakdance: Competição Internacional Red Bull BC One North America Final 2014, Las Vesgas
4. A história do hip hop está ligada, desde a sua origem, às lutas dos negros norte-americanos deflagradas mais intensamente na década de 1960, contra a discriminação e por maior participação política.
“ "A discriminação dos negros está presente em cada momento de suas vidas para recordar-lhes que a inferioridade é uma mentira que só aceita como verdadeira a sociedade que os domina." Martin L. King
"O futuro pertence àqueles que se preparam para o hoje.” Malcolm X
Tais lutas dos negros, ficaram desde então, mais agressivas.
Os primeiros discos de rap começaram a aparecer no final da década de 1970, mas o primeiro grande sucesso comercial do ritmo foi o disco Raising Hell (1986), do grupo americano Run DMC.
"O futuro pertence àqueles que se preparam para o hoje.” Malcolm X
Tais lutas dos negros, ficaram desde então, mais agressivas.
Os primeiros discos de rap começaram a aparecer no final da década de 1970, mas o primeiro grande sucesso comercial do ritmo foi o disco Raising Hell (1986), do grupo americano Run DMC.
Raising Hell (1986) - Run DMC
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O Hip Hop no Brasil e os Racionais MC’s
A A abordagem começa citando o álbum duplo do grupo de rap Racionais MC’s, intitulado "Nada como um dia após o outro dia", de 2002. As letras demonstram um cotidiano de violência, num tom de revolta e denúncia ao preconceito racial.
O grupo é composto pelo quarteto Mano Brown (Pedro Paulo Soares Pereira), Ice Blue (Paulo Eduardo Salvador), Edy Rock (Edivaldo Pereira Alves) e KL Jay (Kleber Geraldo Lelis Simões), e é liderado por Mano Brown, que nasceu na Zona Sul da cidade de São Paulo. Formado em meados da década de 1980, os Racionais se tornaram, ao longo dos anos de 1990, o mais conhecido grupo de rap do país, com enorme popularidade na periferia das grandes cidades brasileiras e também na classe média, especialmente a partir de 1997, quando lançaram "Sobrevivendo no inferno".
O rap dos Racionais pretende, ao que parece, levar a lei da selva que domina a periferia ao interior da casa grande, aos ouvidos da elite. É o propósito que se faz presente, às claras, na música dos Racionais MC’s que dá nome ao artigo de Zeni – “Negro drama”:
O grupo é composto pelo quarteto Mano Brown (Pedro Paulo Soares Pereira), Ice Blue (Paulo Eduardo Salvador), Edy Rock (Edivaldo Pereira Alves) e KL Jay (Kleber Geraldo Lelis Simões), e é liderado por Mano Brown, que nasceu na Zona Sul da cidade de São Paulo. Formado em meados da década de 1980, os Racionais se tornaram, ao longo dos anos de 1990, o mais conhecido grupo de rap do país, com enorme popularidade na periferia das grandes cidades brasileiras e também na classe média, especialmente a partir de 1997, quando lançaram "Sobrevivendo no inferno".
Racionais MC's |
O rap dos Racionais pretende, ao que parece, levar a lei da selva que domina a periferia ao interior da casa grande, aos ouvidos da elite. É o propósito que se faz presente, às claras, na música dos Racionais MC’s que dá nome ao artigo de Zeni – “Negro drama”:
"Ei, senhor de engenho / eu sei bem quem você é / sozinho você num güenta / Você disse o que era bom / e a favela ouviu / uísque, Red Bull, tênis Nike, fuzil / [...] Seu jogo é sujo / e eu não me encaixo / eu sou problema de montão / de Carnaval a Carnaval / Eu vim da selva, sou leão / Sou demais pro seu quintal [...]” “Inacreditável, mas seu filho me imita [...]
[...] Seu filho quer ser preto / Ah!, que ironia!”
Mano Brown ilustra, também, com sentimento de dor compartilhada, o negro drama vivido pelos negros:
“Negro drama / entre o sucesso e a lama / Dinheiro, problemas, inveja, luxo, fama / Negro drama / Cabelo crespo e a pele escura / a ferida, a chaga, à procura da cura / Negro drama / Tenta ver e não vê nada / a não ser uma estrela / longe, meio ofuscada / Sente o drama, o preço, a cobrança / no amor, no ódio, a insana vingança / Negro drama / Eu sei quem trama e quem tá comigo / o trauma que eu carrego / pra não ser mais um preto fodido / O drama da cadeia e favela / túmulo, sangue, sirene, choros e velas/ Passageiros do Brasil, São Paulo / agonia que sobrevive / em meio a zorra e covardias...”
Mano Brown ilustra, também, com sentimento de dor compartilhada, o negro drama vivido pelos negros:
Apesar das denúncias e protestos em forma de canções que visam retratar as realidades escabrosas vividas no submundo das grandes periferias brasileiras, o grupo expressa também um sentimento de ódio inconciliável em suas letras:
"Minha intenção é ruim / esvazia o lugar / Eu tô em cima, eu tô a fim / um, dois pra atirar / Eu sou bem pior do que você tá vendo / O preto aqui não tem dó / é 100% veneno [...] Meu estilo é pesado e faz tremer o chão / minha palavra vale um tiro / e eu tenho muita munição[...]”
Racionais MC's - Diário de um Detento
No Brasil, o hip hop surgiu por volta de 1984, em São Paulo, no centro da cidade, na região da estação São Bento do metrô e nas ruas 24 de maio e Dom José de Barros. No início, o rap se apresentava como canto improvisado para acompanhar as manobras corporais, e era chamado de “tagarela”. Os discos de rap brasileiros começaram a ser gravados no final dos anos de 1980.
Além da grande ênfase que o autor dá aos Racionais MC’s, destaca também a dupla Thaíde e DJ Hum, especificando as músicas “Corpo fechado” e “Homens da lei”.
Thaíde e DJ Hum |
Mar A marginalidade, a violência, as drogas, o sofrimento, a vingança são temas constantes nas letras, a rendição ao crime é colocada como a "solução" para enfrentar o sistema injusto da desigualdade social, o mal é pago com o mal:
Se tocar em minha face sua vida está selada
E não tenho r.g.
Corpo Fechado
Thaíde e DJ Hum
Me atire uma pedra
Que eu te atiro uma granada
Que eu te atiro uma granada
Por tanto meu amigo, pense bem no que fará
Porque eu não sei, se outra chance você terá ...
Você não sabe de onde eu vim
E não sabe pra onde eu vou
Mais pra sua informação vou te falar quem eu sou
Meu nome é ThaídeE não tenho r.g.
Não tenho c.i.c.
Perdi a profissional
Nasci numa favela
De parto natural
Numa sexta feira Santa que chovia Pra valer
Os demônios me protejem e os deuses também
Ogum, iemanjá e outros santos ao além
Eu já te disse o meu nome
Meu nome é Thaíde
Meu corpo é fechado e não aceita revide, Thaíde ...
Na 43 eu escrevi o meu nome numa cela
Queimei um camburão
Que desceu na favela
Essa prece que tu rezas eu já muito rezei
Em briga de rua já quebraram meu nariz
Não há nada nesta vida que eu já não fiz
Vivo nas ruas com minha liberdade
Fugi da escola com 10 anos de idade
As ruas da cidade foram minha educação
A minha lei sempre foi a lei do cão
Não me arrependo de nada que eu fiz
Saber que eu vou pro céu não me deixa felizEssa prece que tu rezas eu já muito rezei
E pro deus que tu confessas eu já muito me expliquei
(refrão)
ThaídeTenho o coração mole mas também sou vingativo
Por tanto pense bem se quer aprontar comigo
Se achas que esse neguinho sua bronca logo esquece
Então não perca tempo pergunte a quem conhece
Eu só gosto de quem gosta de mim
Mas se for os meus amigos eu luto até o fim
Se mexer com a minha mãe
Meu dj ou minha mina você pode estar ciente sua sorte está perdida
Pode demorar mas eu sempre pago minhas contas
Também não sou louco pra dar soco em faca de ponta
Sempre cobro as minha contas com juros e correção
16 toneladas eu seguro numa mão Thaíde ....
Não nasci loirinho com o olho verdinho
Sou caboclinho comum nada bonitinho
Feio e esperto com cara de mal
Mas graças a Deus totalmente normal
(refrão)
Thaíde ...
Mas meu nome é Thaíde ...
Os Racionais já haviam abordado o tema em “O homem na estrada” – a música descreve o cotidiano de um ex-presidiário que tenta reconstruir sua vida; e em “Diário de um Detento”.
O autor cita ainda, o grupo Z’África Brasil, que conjuga protesto e humor, e que, “inovando”, discorre sobre a luta e a escravidão que é compartilhada tanto por negros quanto por brancos. O grupo gravou, em 2002, o cd "Antigamente quilombos, hoje periferia". Os dois principais letristas e cantores do grupo são o MC Gaspar, branco, e o MC Funk Buia, negro.
O Rap da Vingança e o Rap da Esperança, o Rap do Ódio e o Rap do Amor
Como visto, o rap brasileiro adentrou aos lares com a caricatura não só do protesto, mas também do ódio e da vingança. Logo, esse ideal seria combatido por uma nova proposta orientada por preceitos cristãos, o rap passou a ser reformulado como disseminador do espírito da paz em seu sentido amplo, a paz a ser alcançada pela paciência e perseverança, pela resistência do amor ao ódio, nessa outra vertente, perder é ganhar!
Trata-se dos grupos de rap com visão cristã, o "protesto do bem" contra o "protesto do mal" é retratado nas letras e batidas e o que seria aliado aos vingadores das quebradas em prol da sua raça e classe, passa a se auto-afirmar como opositor do mal pelo mal.
Trata-se dos grupos de rap com visão cristã, o "protesto do bem" contra o "protesto do mal" é retratado nas letras e batidas e o que seria aliado aos vingadores das quebradas em prol da sua raça e classe, passa a se auto-afirmar como opositor do mal pelo mal.
Aqui no Brasil, o nome de destaque que consolidou essa nova vertente do rap integralizado no amor, e levantou a bandeira do rap alicerçado em ideais cristãos, é: Luís Werneck, conhecido popularmente por DJ Alpiste, rapper precursor na composição do estilo com temática religiosa protestante.
DJ Alpiste - Vencer o Mal
Com a "ascensão" do DJ Alpiste, diversos rappers e grupos fincados no gênero hip hop, começaram a surgir e se espalhar pelos quatro cantos do Brasil, desde novos grupos menos conhecidos, até outros mais projetados, como o recente "boom" no cenário nacional do grupo Ao Cubo e do rapper Pregador Luo.
Enfrentando os preconceitos que ainda são inextrincáveis ao ritmo e aos seus representantes, o crescimento do rap nacional voltado à vertente cristã começou a ser bem mais notável e influente; uma vez que o discurso do ódio passou a dar lugar a mensagens de esperança, fé e amor, a população passou a respaldar a "nova forma" de se fazer rap e a acolher o gênero com maior aceitação e reconhecimento.
Ao Cubo - Abençoado por Deus
CONCLUSÃO
Fica claro que, apesar de enfrentarem diversos preconceitos e intensos sofrimentos, os grupos de rap citados no artigo tentam assumir um posto de representação da própria raça e classe utilizando a "violência para vencer a violência"; à base da expugnação (a vitória pelas armas), esses grupos de rap têm como proposta, não só expressar as dores e mazelas sociais a que são submetidos desde a escravidão, mas infelizmente, propagar mensagens apologistas de uma justiça feita com as próprias mãos.
A análise nos leva à uma faca de dois gumes: mas é evidente que o negro, hoje, ocupa e vem ocupando cada vez mais, várias posições de destaque, sem precisar contudo, "vencer o crime pelo próprio crime", e embora marcado pela presença do constante racismo, continua mostrando, ao contrário de certas composições, que o mal só pode ser, de fato, vencido pelo bem.
vio "A violência cria mais problemas sociais do que os que resolve." Martin Luther King
"Não é lamentável que só possamos obter a paz, preparando-nos para a guerra?" John Kennedy
BIBLIOGRAFIA
CHANG, J. Can’t stop, won’t stop - A history of the hip hop generation. New York, 2005. 546 f.
FIALHO, Vania Malagutti; ARALDI, Juciane. Fazendo Rap na Escola. Associação Brasileira de Educação Musical – Música na Educação Básica, Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 76-82, out. 2009.
MACEDO, Iolanda. O Discurso Musical Rap: Expressão local de um fenômeno mundial e sua interface com a educação. 2010. 230 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro de Educação, Comunicação e Artes, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Cascavel, 2010. Disponível em: <http://200.201.88.199/portalpos/media/File/Dissertacao_IOLANDA_%20MACEDO.pdf>. Acesso em: 31 out. 2014.
PIMENTEL, S. O Livro Vermelho do Hip Hop. Disponível em <https://clam.sarava.org/sites/clam/files/Pimentel,Spensy.PDF > Acesso em: 31 out. 2014.
ROCHA, Janaina; MIRELLA, Domenich; CASSEANO, Patrícia. Hip Hop: A periferia grita. 2001. Disponível em: <http://www.fpabramo.org.br/uploads/hip_hop.pdf>. Acesso em: 31 out. 2014.
SUNEGA, Fernanda Alves. Movimento hip-hop e os meios de comunicação: reprodução ou resistência? 2006. Disponível em: <http://ucbweb2.castelobranco.br/webcaf/arquivos/13147/5061/hip_hop_5.pdf>. Acesso em: 31 out. 2014
VIDON, Geyza Rosa Oliveira Novais. A narratividade do hip-hop e suas interfaces com o contexto educacional. 2014. 184 f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2014. Disponível em: em: <http://portais4.ufes.br/posgrad/teses/tese_7573_TESE_GEYZA_JUNHO__2014.pdf>. Acesso em: 31 out. 2014.
ZENI, Bruno. O negro drama do rap: entre a lei do cão e a lei da selva. Estudos Avançados, São Paulo, vol. 18, n. 50, fev. 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142004000100020>. Acesso em: 31 out. 2014.
"Não é lamentável que só possamos obter a paz, preparando-nos para a guerra?" John Kennedy
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